"Civilizando o Samba": música, política e imprensa na Era Vargas

por Felipe Cavalcanti

Plano elaborado para 2 aulas

90 min

Esta aula, destinada ao 3o e 4o anos do Ensino Médio, aborda a relação entre música e política durante o período do Estado Novo (1937-1945), atentando para a transformação do samba em um símbolo de identidade nacional a partir de 1930 e para a tentativa realizada pelo DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) de censurar o samba e moldá-lo aos ideais do trabalhismo varguista no Estado Novo.

CURSO: A Canção Popular no Ensino de História

Objetivos

-Contextualizar o surgimento do samba, considerando suas matrizes europeias e afro-brasileiras

-Contrastar o "samba-malandro" ao discurso eugenista e criminalizante adotado por instâncias governamentais contra a população afro-descendente

-Analisar a relação entre música e política no Estado Novo por meio do exame de canções produzidas à época e de seus processos criativos.

Requisitos

Para a realização desta aula, pressupõe-se que os alunos já deverão ter estudado e analisado junto ao professor temas relativos à Primeira República e da Era Vargas.

No mais, requere-se os seguintes materiais para a realização da aula:

-Projetor Multimídia ("Data Show")

-Caixa de Som

-Acesso à internet

-Papel impresso com as letras (podem ser enviadas via internet)

-Quadro branco e pincel

Avaliação

A avaliação desta aula será feita em dois momentos: na própria aula, por meio da participação dos alunos na discussão; e posteriormente, com base em um trabalho em dupla sobre o tema proposto, já explicitada na parte "6" do roteiro de atividades.

Lista de atividades

Atividade oral envolvendo a classe (perguntas/respostas/debate)

5 min

Em um momento introdutório, o professor deverá indagar aos alunos sobre o samba outros gêneros musicais dele derivados (como o samba-rock, bossa-nova, pagode, samba de enredo, etc), com que frequência escutam, quais artistas / canções, etc. A ideia é partir dos experiências e conhecimentos prévios dos alunos sobre o gênero musical para então começar a aula sobre o samba e sua história.


Vídeo/Música/Imagem

20 min

Considerando a música como uma prática híbrida (BURKE, 2018), cabe realizar aqui uma breve exposição sobre a relação entre o Lundu e as origens do samba-maxixe, enfatizando as matrizes rítmicas e melódicas de modo a contextualizar o surgimento do samba na passagem do século XIX para o século XX. Pode ser feita aqui uma comparação entre o Lundu e a canção "Pelo Telefone", de Donga, considerado o primeiro samba gravado (1916), destacando-se as matrizes rítmicas de origem africana e europeia presentes no gênero musical nos seus primórdios, como o ritmo sincopado e a percussão (originados na música africana e afro-brasileira), os timbres dos instrumentos (de matriz europeia, especialmente no "lundu de salão", etc.).

Leitura de texto em sala de aula

20 min

Em um segundo momento, o professor deverá expor brevemente acerca do enfrentamento entre o samba e as autoridades policiais e governamentais na Primeira República, enfatizando a questão da eugenia e da criminalização dos indivíduos e da cultura de origem afro-brasileira (SCHWARCZ, 1993). Para tanto, podem ser feitas comparações breves entre excertos de textos eugenistas de Nina Rodrigues acerca da "inferioridade étnica" dos afro-descendentes (discurso que era veiculado na polícia, nas faculdades de direito e de medicina, dentre ouras instituições) e a letra da canção "Ora, Vejam Só", de Sinhô, na qual estão presentes tanto o enfrentamento das populações afro-brasileiras com a polícia bem como a exaltação da "malandragem" (ver anexo). Além disso, há que se notar que a canção de Sinhô, na interpretação de Francisco Alves, encontra-se mais formatada dentro do samba urbano que estava se consolidando nos anos 1920. Caso haja mais tempo disponível, pode-se inclusive ouvir a canção de Sinhô junto aos alunos para uma compreensão mais ampla.

Vídeo/Música/Imagem

20 min

Após uma breve explicação do professor acerca da Era Vargas (em forma de retomada) e, principalmente, do Estado Novo, com foco no trabalhismo varguista, do surgimento do Departamento de Imprensa e Propaganda, e da tarefa deste de censurar e adequar o samba - considerado um gênero musical menor e marcado pela ideia de "malandragem" - aos ditames do regime, é hora de abordar um clássico do cancioneiro popular brasileiro: trata-se da "Aquarela do Brasil", de Ary Barroso. A análise deve ser feita tanto do ritmo (considerando a síncope, a percussão) como dos timbres (enfatizando os instrumentos de sopro), apontando para seu enquadramento dentro do samba urbano dos anos 1920 (mais distante do samba-maxixe, por exemplo); e da letra (em especial, a exaltação ufanista da pátria). Embora não se trate do primeiro samba a exaltar as belezas naturais do Brasil em tom nacionalista, é um clássico de fácil acesso aos alunos, cujo processo de composição envolve: (a) a mudança na formatação de um novo tipo de samba urbano e negociação junto ao DIP para a liberação de certos versos (notadamente "terra de samba e de pandeiro", considerado depreciativo pelo Departamento). Estes dados são indicativos não apenas do ufanismo estimulado pelo Departamento de Imprensa e Propaganda, mas também pela visão negativa do samba manifestada pelos ideólogos do Estado Novo.

Vídeo/Música/Imagem

20 min

Por fim, agora a ideia é analisar as relações entre música e trabalho no Estado Novo por meio da escuta de "Bonde de São Januário", de Ataulfo Alves. Após breve exposição sobre Vargas e sobre o trabalhismo varguista (novamente em forma de retomada), deve-se abordar a canção, cuja versão original mostrava um sujeito avesso ao trabalho e próximo da "malandragem", foi censurada pelo DIP para se enquadrar nos ideais do trabalhismo varguista. Neste sentido, a proposta é: (a) analisar junto aos alunos a canção em seus elementos rítmicos e melódicos, de modo a relacioná-la com o repertório anteriormente analisado; (b) examinar brevemente a letra censurada pelo DIP, apontando sua contrariedade ao trabalhismo estadonovista; e (c) destacar, na sua letra final,as adaptações à censura do DIP e aos ditames do trabalhismo varguista.

Atividade a ser realizada em casa pelos alunos (lição de casa)

5 min

De modo a averiguar os conhecimentos construídos em sala de aula, ao final, deve-se explicar brevemente a atividade para casa, que está disponível em anexo. A atividade deve ser entregue na semana seguinte.

Referências

FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (orgs.). O Brasil republicano. Vols 1 e 2. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.

GOMES, Ângela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: FGV, 2005.

"Música no Estado Novo". Disponível em: https://expo-virtual-cpdoc.fgv.br/sites/expo-virtual-cpdoc.fgv.br/files/documentos/musicas_e_artistas_-_vargas_-_final.pdf Acesso em: 09/12/2019

RODRIGUES, Marcela Franzen. Raça e criminalidade na obra de Nina Rodrigues: Uma história psicossocial dos estudos raciais no Brasil do final do século XIX. Estud. pesqui. psicol., Rio de Janeiro , v. 15, n. 3, p. 1118-1135, nov. 2015 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-42812015000300019&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 09 dez. 2019.

SANDRONI, C. Feitiço decente: transformações do samba no Rio de Janeiro (1917-1933). Rio de Janeiro: Zahar, 2001

SCHWARCZ, Lilia Moritz. O Espetáculo das Raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

VIANNA, Hermano. O Mistério do Samba. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1995.